Lomyne's in tha house

Já não sou mais tão jovem para ter tantas certezas.

Devaneios sobre cultura

Tenho uma amiga que escreve maravilhas, dela recebi um e-mail muito bom. Transcrevo aqui um trecho do e-mail e a minha resposta. Acho que vale a pena a leitura.

Bom, as minhas expectativas para 2004 não são muito boas, aliás, para o futuro em si não são muito boas. O problema é q não vejo o homem evoluir como os homens de 30 anos atrás. Ainda não é neste ano e nem nesta década q eu vou ver um Machado de Assis, um Portinari, um Dostoievsk, uma Clarice Lispector, uma Cecília Meireles, um Chopin, um Jimi Hendrix, um Bob Marley, um Cazuza, um Gandhi, uma Elis da vida, sacaram?

Apesar de toda a tecnologia, não consigo ver um modelo de homem. Nós estamos (apesar da quantidade de informações q recebemos) cada vez mais vazios…esta é a Era Superficial. Aproveitem!!!
By Carol

Eu me lembro de uma música do Ultraje, chamada Rebelde sem Causa: “como é que eu vou crescer sem ter com quem me revoltar?” Acho que realmente faz falta um motivo pra se formarem grandes pensadores e artistas. Não acho muito possível se encontrar pessoas com algo a dizer quando quase nada do que rola por aí é capaz de despertar tais “coisas a dizer”. É uma questão de inércia, só se produzem grandes atitudes e idéias quando o que acontece incomoda as pessoas, ou seja, tira-as de sua acomodação natural. Como meu pai costuma dizer, infeliz do governante cujo povo chegou ao fundo do poço, porque estes não têm mais nada a perder. Enquanto as pessoas encontram alguma possibilidade de estagnação é assim que elas permanecem.

Ontem fiz um comentário enquanto via a minissérie nova que acho bem adequado ao tema deste post: na verdade, estamos em entresafra. Explicando: 1920, início da minissérie, uma época pela qual sou bastante apaixonada, pois é o berço do tenentismo (pra quem não sabe, por favor, cate livros de história, porque eu me nego a explicar). Tanto pentelharam que vimos surgir aí a Semana de Arte Moderna de 22, uma pérola da qual pouca gente se orgulha, pois muitos nem sabem que existiu ou o que provocou. Daí viemos com Getúlio e sua extensa governância de 1930 até 45, cuja repressão nos concedeu poetas fabulosos e gênios memoráveis em outras artes. Então temos nossa primeira entresafra: o populismo, uma fase política linda, com um povo feliz (fudido, mas feliz) quando poucos grandiosos foram revelados. Logo depois, uma ditadura, uma repressão de 20 anos que encontrou políticos, poetas, sonhadores, pintores, músicos, todos excepcionais. E com o fim da ditadura, nesta terra vivemos uma nova entresafra, pois quando o povo não é proibido de falar ele se cala, mas diante da mais leve ameaça de supressão do que pode-se fazer, aí sim explodem artistas e gênios de todas as artes.

Por enquanto, só resta a nós, pobres tolos conscientes da pasmaceira, o dom da paciência até a próxima repressão ao ouvir Tribalistas – que não passam de uma idéia infame de música com tanto efeito bobo que já se perdeu na poesia – e outros “magos” a cantar novamente o amor perdido, sobras de lembranças de outras gerações. Quem sabe possamos esperar mais do que isso da próxima geração, porque a nossa é a cara do BigBrother Brasil.

Ao que me parece, hoje ter idéias de sacudir sociedade é coisa de gente rebelde sem causa e engloba um grupo de estereótipos. Penso cá com os meus botões que isso não está totalmente errado, mas também acho muito pouco para definir o que se chama vida inteligente no Brasil. E quase nada pra quem pretende mudar o mundo. O maior problema dos virtuoses não é que eles não existem por aqui e sim que eles não estão sendo despertados. E para quem manda nesta baderna, nada é mais útil do que a passividade popular, não acham?


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