Lomyne's in tha house

Já não sou mais tão jovem para ter tantas certezas.

A gorda e o mundo

Ter problemas com o peso é uma luta árdua. Quem tem, entende. Se você veste manequim até 44, você não sabe do que eu estou falando. Se uma loja comum de shopping tem roupa que te sirva, agradeço a empatia, mas você não sabe realmente do que eu tô falando. Eu tô falando de estar gorda de verdade, não de querer perder 3kg antes da próxima grande festa.

Depois de adulta, eu nunca me importei muito com isso, porque afinal até a adolescência deixei que o mundo me torturasse dizendo que eu deveria vestir 36, no máximo 38 – sim, eu sou gorda desde sempre, desde bebê, a vida inteira. Mas esse lance de não me importar acabou passando dos limites.

Em meados do ano passado, eu cheguei ao meu maior peso, meu pior manequim, sobrecarga emocional, estresse, crises de estômago. Foi o módulo de Coaching e Marketing Profissional na pós-graduação que mudou tudo. Sabia que eu não tinha problemas profissionais, então estava bem de boa, mas no processo sensacional que é o coaching, entendi que estava na hora de arrumar outros aspectos da minha vida, porque nem só de carreira vive a mulher.

Começa que fui no médico. Porque gordo geralmente não vai no médico, né mores. Eu fui. Aquele choque de realidade, muito além da balança. Colesterol, glicose, hormônios, refluxo, tudo cagado. Foi quando decidi virar a mesa, por necessidade mesmo.

5 meses depois, dieta, remédios, academia. 22kg perdidos, pouco mais do que a metade do caminho e olha, algumas coisas mudam, outras não. Outro dia precisei correr uns 15m atrás do ônibus pra não perder. Sobrevivi e isso foi lindo. As coisas que eu faço sozinha (ou com uma pessoa) melhoraram muito, ganhei pra caralho em qualidade de vida. Ainda tô gorda, mas tenho me dado muito bem com espelho e balança, bem feliz comigo mesma.

O foda são as pessoas. Sejam conhecidos ou aleatórios, não interessa o tipo de relação, sempre tem um conselho não solicitado pra tentar te enfiar goela abaixo. Por que você vai faz a dieta Dukan? Ah, com carboidrato zero você vai ter muito mais resultado. Mas você tá fazendo academia? Tem que fazer uma série assim e assado. Ah, outro dia eu vi que o remédio tal emagrece, porque você não toma também? Tem aqueles chás, né? Substitui uma refeição que você vai ver o efeito.

Ora caralhos, tô pedindo sugestão? Eu não sei quem me parece mais absurdo: se é a pessoa que sabe tudo que eu tô fazendo pra melhorar – com acompanhamento de profissionais sérios – e ainda quer cagar regra que viu na televisão/minha amiga fez; ou se é o aleatório de baixa interação que te vê com frequência e fala isso sem perguntar. Além do que, todo esse meu processo de perda de peso tem sido acompanhado por profissionais, não consigo entender porque as pessoas insistem em achar que o que viram no programa de tv ou na revista de dieta deve/pode ser melhor do que acompanhamento sério e personalizado.

Outra coisa foda é a academia. Ou melhor, algumas pessoas na academia. Sabe o que eu reparei? As pessoas de corpo mais espetacular, homens e mulheres definidos, estão super de boa, dão bom dia, um sorriso e seguem a vida. Já as pessoas fora de forma… É completamente insano receber aquela olhar te julgando de cima abaixo vindo de uma pessoa que está lá tentando mudar seu corpo, sejam outras gordas ou extremamente magras. E acontece pra caralho, essencialmente mulheres. Acontece na rua também, enquanto volto pra casa toda suada e destruída (na rua esse olhar vem de todo tipo de gente, esse olhar de julgamento).

Fica a impressão de que ali não é o meu lugar ou que por ter o corpo que eu tenho hoje estou fracassando miseravelmente. Indo além, aquele julgamento de que não posso estar bem assim, como se só fosse possível ser feliz dentro de um determinado padrão. Você tá gordo(a)? Não adianta ir pra academia porque não tá funcionando. Também não pode usar certas roupas, não pode comer hambúrguer nunca, nem estar com uma pessoa bonita/magra. Há um forte peso social no fato de que se você tá gordo, há uma lista de coisas que você não tem o direito de fazer: comportamentos, roupas, sentimentos, não merece muita coisa, resumindo bem, não merece ser feliz. Cara, isso é uma merda muito errada.

Ninguém olha pra magrinha se acabando num sundae e pede pra ela o exame de sangue pra saber se o colesterol tá lá na lua. Aliás, ninguém julga nada de mulher magra. Tá magra? Então pode comer o que quiser, beber o que quiser, vestir o que quiser e se comportar como quiser. A licença social pra quem é magro é completamente diferente. É tudo uma merda muito errada meramente estética.

Essa merda toda tem nome: Gordofobia. Acaba emocionalmente, mesmo quem já venceu mais de metade do trajeto, mesmo tendo um puta resultado. Eu não sou a única que me machuco assim. E é uma escrotice que, quando vem de quem está passando o mesmo perrengue, aí sim é de foder. Tem gente por aí tão massacrada por isso que não aceita a si mesmo e ainda tá comendo o coração dos outros com farinha.

Então, pessoas, posso pedir uma coisa de todo o coração? Faz o exercício mental de não julgar pessoas pelo corpo, não passar aquele olhar que mede e considera a pessoa insuficiente. Eu sei que é um puta exercício difícil, não posso dizer que eu não tenha meus momentos, mas bora se esforçar? Não importa em que ponto esteja de sua própria jornada, deixa o coleguinha em paz.

p.s.: caso caiba a curiosidade, todas as fotos da imagem são dos últimos 5 anos, um período no qual oscilei mais de 40kg. Hoje já foram 22kg, ainda faltam 18kg para o limite inferior, quando poderei andar por aí sem ser julgada por ser gorda. Nobody fucking care how hard it is.

p.s.2: Depois deste, mais posts foram escritos sobre emagrecer, dá uma olhada:
Sobre ser uma mulher visualmente interessante
Como eu perdi 40kg


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Escritos de outros dias