Lomyne's in tha house

Já não sou mais tão jovem para ter tantas certezas.

Ô Abre Alas, o Bolsonaro vai passar

Em pleno Carnaval, o presidente do Brasil Jair Bolsonaro causou mais uma vez. Poderia estar trabalhando, poderia estar falando o que pensa só para os amigos íntimos, mas como qualquer adolescente bêbado que se preze, estava usando o Twitter sem pensar. A fuzarca foi tamanha que eu estava contando as horas para ver o William Bonner explicar o que aconteceu em rede nacional (confesso que me diverti).

Parágrafo de explicação pra você que passou o Carnaval num bunker: Vossa Excelência publicou um vídeo sobre o que “tem virado muitos blocos de rua no carnaval brasileiro“. Eu me recuso a incorporar o tweet, se quiser ver, clica aqui. Na manhã seguinte, lá estava ele perguntando no Twitter O que é golden shower?

VOSSA EXCELÊNCIA NÃO SABE PROCURAR NO GOOGLE ANTES DE COLOCAR NO TWITTER!

Acho que faz uns 10 anos que qualquer usuário do Twitter sabe que tuitar uma pergunta é correr risco de passar ridículo. Talvez o presidente ache que ele não é “qualquer um”. Se for isso, eu não consigo compreender como o nobre senhor não sabe que “não ser qualquer um” é muito mais catastrófico.

Ontem meu marido até comentou a noite: mas será que é ele mesmo que posta no Twitter? Não é um funcionário? Meu argumento é que não, porque afinal um funcionário seria alguém que pensaria o que está fazendo. Um funcionário sabe usar o Google, quem sabe até entenda de redes sociais. No mínimo, um funcionário não faria isso por medo de perder o emprego.

Aliás, por falar nisso, uma animação momentânea se espalhou com a possibilidade de impeachment por quebra de decôro. Aham, vamos derrubar um presidente por causa de um tweet. Por favor, não sejam ridículos! Dois meses de governo e já temos uma quantidade gigante de cenas constrangedoras muito mais sérias, essa não será o suficiente. Além do quê, se rola esse impeachment, já reparou no vice? Como isso seria motivo de alegria?

Sabe em quem eu penso? Nas almas infelizes trabalhando com comunicação e jornalismo. Vi pelo menos 3 jornalistas brasileiros que moram fora contando que colegas gringos vieram perguntar “foi o presidente mesmo? Isso não é fake?” Imagina que bosta, você tendo que explicar o mau uso da internet do seu presidente. Pensa nos coitados que não votaram nele e tem que explicar essa situação ridícula! Já repercutiu muito mal na Inglaterra, na Alemanha, em Portugal e na Argentina. Segundo essa notícia, foram mais de 260 mil notícias pelo mundo. Pesquisei no Google, recomendo.

Aí corre o pessoal da comunicação social da Presidência da República pra fazer uma nota no mínimo risível:

“A respeito de publicação realizada na conta pessoal do Presidente da República, em 5 de março, convém esclarecer que:
– No vídeo, postado pelo Sr Presidente da República em sua conta pessoal de uma rede social, há cenas que escandalizaram, não só o próprio Presidente, bem como grande parte da sociedade.
– É um crime, tipificado na legislação brasileira, que violenta os valores familiares e as tradições culturais do carnaval.
– Não houve intenção de criticar o carnaval de forma genérica, mas sim caracterizar uma distorção clara do espírito momesco, que simboliza a descontração, a ironia, a crítica saudável e a criatividade da nossa maior e mais democrática festa popular.”

Sério, galera, vocês que estão trabalhando aí na comunicação da Presidência: vocês dormem à noite? O dinheiro tá compensando a vergonha? Ou vocês não tem vergonha? Vocês teriam coragem de olhar nos olhos dos seus professores de faculdade de comunicação e dizer pra eles “eu me orgulho do que eu estou fazendo porque estou ajudando a fazer um país melhor“? Sério, como vocês conseguem?

Na verdade essas perguntas são retóricas. Eu conheço uns torcedores do Bolsonaro. Tenho um grupo de WhatsApp cheio deles (e defender o Bolsonaro nem é a coisa mais escrota que costuma rolar ali, por isso no mudo e eternamente ignorado). Eu poderia conversar com eles para saber o que pensam. Mas sabe, eu não quero. Eu não tenho estômago para descobrir até que ponto vão defendê-lo em nome da moral e dos bons costumes, estes legítimos cidadãos de bem contra a corrupção. E também não sei dizer até que ponto conseguiria ouvi-los civilizadamente antes de começar a jogar na cara as práticas destes mesmos cidadãos de bem.

Este post começou a ser escrito na quinta-feira, dia 7 de março. Antes de eu terminar e publicar, Vossa Excelência já disse que “democracia e liberdade, só existe quando a sua respectiva Forças Armadas assim o quer” (link) e recomendou que pais arranquem as páginas sobre educação sexual da Caderneta de Saúde da Adolescente, além de avisar que vai reeditar (link). É tanto absurdo que eu não faço a menor ideia de porquê me dou ao trabalho.

Eu não sei como conseguem dormir à noite. Eu só sinto vergonha. Vergonha alheia, porque não foi com meu voto que ele chegou lá.

Malvados – André Dahmer

Créditos da imagem do cabeçalho: Marcelo Camargo/Agência Brasil [CC BY 3.0 br], via Wikimedia Commons, imagem redimensionada.


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