O Marcelo levantou a bola de papo sobre o estudo universitário e como meu comentário já estava começando a ficar do tamanho de um post, achei por bem colocar aqui. Mas já que eu vou replicar, é preciso ler o que ele disse primeiro. Vai que eu espero.
Fico pensando em que momento perdemos o trem da história e rotulamos estas profissões como menos dignas. Em que momento escrevemos a história de um país de doutores em casas com torneiras pingando. Olha, eu não sou nenhum gênio, mas me considero capaz de responder essa pergunta. Rotulamos essas profissões como menos dignas quando não quisemos pagar cem reais pelo dia do pedreiro, mas pagamos duzentos na consulta com um dermatologista que nem aceita plano de saúde. Rotulamos quando achamos um absurdo pagar oitenta reais para uma boa diarista ou achamos que é muito dinheiro pagar trezentos a um estofador para reformar o sofá da sala e no entanto pagamos cinco mil a um decorador, que vai pintar as paredes, pagar trezentos reais ao estofador e embolsar 4.500.
Isso não é sobre glamour. Isso é sobre quanto estamos dispostos a pagar. Se todo mundo quer pagar pouco, quem estará disposto a prestar o serviço? No fundo, é sempre sobre dinheiro. Pense em alguém que foi fazer a América – ou Japão, ou Europa -, todo mundo conhece alguém que foi. Some as conversas com os que voltaram e com os que não voltaram. Essas pessoas faziam/fazem o que lá? Faxineiras, motoristas, manicures, encanadores. Ora, mas porque então não fazem aqui? Porque aqui nenhuma manicure consegue faturar cinco mil por mês.
Talvez esse papo não passe realmente de um sonho burguês, mas até onde me conste o maior motivo para se trabalhar é ganhar dinheiro. Tem gente que faz questão de trabalhar com o que gosta e tem gente que trabalha om qualquer coisa, mas no fundo é só sobre dinheiro. Não há altruísmo que encha uma panela vazia. Na minha cabeça, trabalho serve para financiar nossos sonhos. E nós acabamos por querer economizar justamente quando vamos gastar com prestadores de serviço cuja renda é menor que a nossa. Acaba sendo aquela lógica de quem precisa de quem. Um dermatologista super caro não precisa do cliente de classe média, o cliente é que precisa dele. Assim como a classe média considera que não precisa daquela “diarista exploradora que cobra cem reais por dia”, mas paga isso para que um cabelereiro lhe deixe com o visual igual da novela – e olha que o cara faz isso em meia hora!
Mas voltando à questão de ser um sonho burguês, são os filhos de prestadores de serviço (representantes comerciais, eletricistas, taxistas, manicures) que lotam os bancos universitários, porque seus pais lhes embutiram o valor de que a vida de quem se forma médico ou advogado é mais fácil do que a de quem trabalha como prestador de serviço que não exige formação superior. Entramos na faculdade porque nossos pais querem que tenhamos vida mais fácil que a deles. E talvez em um futuro não muito distante nós façamos pressões gigantescas para que nossos filhos façam faculdades técnicas industriais, para que eles tenham uma vida mais fácil do que a nossa.
E como eu sempre tenho um espírito de porco a me fazer comentários, talvez tenha razão uma amiga minha, que diz que em cinquenta anos nós teremos que reconstruir o mundo com paus e pedras, aprender a viver do campo de novo, porque agricultores são os grupos que mais diminuem ao redor do mundo. Na Itália, segundo outra amiga que morou lá por dois anos, a característica agrícola do país, conhecido como celeiro da Europa – isso é cultura de almanaque, vá – encontra cada vez mais dificuldades de preservação, porque o govero tem o hábito imbecil de subsidiar a vida daqueles interessados pelo estudo acadêmico e os jovens acabam emendando um curso de faculdade em outro, só para não ter que voltar a trabalhar no campo. Tudo isso é sobre dinheiro. Sempre vai ser.
p.s.: já vou avisando, quem me vier com comentário socialista eu vou mandar à merda.
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