Lomyne's in tha house

Já não sou mais tão jovem para ter tantas certezas.

Burro não, analfabeto funcional

“O mundo está burro demais pr’eu ter ânimo de escrever”. Liguei o computador e encontrei essa frase abandonada no meu bloco de notas. Eu sei, um eufemismo deveria ser colocado no lugar, a gente sempre busca eufemismos quando vamos escrever algo que qualquer um pode ler. Nunca se sabe quem vai se ofender e a ofensa se mede pela régua do ofendido. Digamos que seria mais adequado algo como:

3 em cada 10 brasileiros são analfabetos funcionais. 88% dos brasileiros não são proficientes. 1 em casa 5 brasileiros com mais de 25 anos superestima sua capacidade de ler.

Indicador Nacional de Alfabetismo Funcional – IPM/IBOPE (fonte)

São tempos difíceis os atuais. Joguei fora uma dúzia de rascunhos políticos nos últimos meses. Sou contra o presidente atual do Brasil, mas nem tudo que eu descartei era contra o Bolsonaro. Pelo contrário, várias vezes as notícias e opiniões contra o Bolsonaro são tão fora da casinha quanto as coisas a favor. Temos um problema sério de viés de confirmação. De fato, o que me levou a escrever esse post foram as vezes em que eu li alguma coisa contra ele fazendo o maior alarde e eu pensei calma, gente, não é bem assim, nem tudo é tão podre quanto vocês estão gritando.

Eu vivo em uma confortável bolha nas redes sociais, que é onde esse blog tem algum alcance. Quem lê o que eu escrevo, me conhece de alguma forma. Isso é confortável em muitos aspectos, afinal não estou falando com desconhecidos, não vivo disso, não tenho a pretensão de sair lacrando. Mesmo nessa bolha, muitas coisas são complicadas de se dizer. Coisas que são muito longas de explicar, coisas que vão ofender certas hipocrisias sociais, coisas que podem afetar relações profissionais ou pessoais.

Eu começo os posts, escrevo vários parágrafos, sempre tenho dificuldade de escrever um bom final. Aí eu deixo para o dia seguinte, torno a ler e percebo que tem coisas complicadas. Começo a editar, troco 30 eufemismos, tiro parágrafos inteiros, procrastino mais uma revisão. Dias passam, o assunto passa e eu abandono o texto. Isso quando não perco um rascunho em uma reinicialização e fico com preguiça de reescrever.

Tudo isso porque eu acho que está cada vez mais difícil se comunicar. E porque quanto mais velha eu fico, mais cuidado eu quero ter com o que eu escrevo. Talvez eu tenha melhorado meu bom senso, talvez não. Cada vez mais a frase no subtítulo do blog faz mais sentido: já não sou mais tão jovem para ter tantas certezas. Mas parece que o mundo segue na direção contrária, com cada vez mais certezas, menos fundamentadas.

Segue o baile, porque como eu disse antes, não sei encerrar textos. E porque não tem como encerrar bonito, esse post é só isso mesmo, pura rabugice.

p.s.: se por acaso você acha que o IBOPE perdeu a credibilidade e se você é adepto de que a verdade só é propagada pelas mídias favoráveis ao atual presidente, saiba que o número pode ficar pior: “apenas 8% da população tem capacidade de interpretar textos sem nenhum tipo de dificuldade” de acordo com esta notícia publicada no R7. Eu não acredito em notícias que carecem de fontes, por isso usei os números do IBOPE. Antes de pensar “isso tudo é culpa do PT“, me faz um favor: se pergunte se você não está naqueles 20% que superestimam a própria capacidade de interpretação de texto. Isso é bem mais importante.


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