Lomyne's in tha house

Já não sou mais tão jovem para ter tantas certezas.

Conteúdo não dá em árvore

Hoje pela manhã um print esse tweet abaixo passou pelo meu Facebook. Minha resposta foi tão longa nos comentários que achei mesmo que merecia um post no blog. Eis a questão:

Deixei um comentário cínico, que virou uma thread que é digna de um post nesta velha casa, porque já estava enorme a minha resposta, porque muitas vezes falta senso crítico nas questões que propomos. Do meu jeito cínico:

Ah, sim, claro, trabalhe 20h por semana fazendo um conteúdo importante porque as pessoas querem de graça no Youtube, pulando anúncio, sem ninguém pra ajudar a financiar e vai todo mundo continuar dando atenção ao ambientalismo do Felipe Neto. Mas você que tem conhecimento tem obrigação de compartilhar de graça tudo que aprendeu pra ser especialista, porque foda-se, você não precisa ser remunerado, seu tempo é gratuito.

E minha amiga respondeu que…

Eu compreendo que as pessoas precisam viver… Não obstante também creio na lei da replicabilidade e penso que ela deveria ser aplicada para muito além do Felipe Neto, pois é necessário na web mais Iberês e Manuais do Mundo… Para que a gente não se encontre aonde está hoje. Considerando também que se dá pra viver benzaço sendo um YouTuber, fazendo palestras, escrevendo livros e afins, porque não usar essas mídias para produzir conteúdo decente e ainda assim, bem viver???

E a resposta pra isso é mais complicada do que parece, porque está no campo das coisas que as pessoas não pensam a respeito. Falta uma perspectiva muito importante que aparentemente todo mundo precisa, inclusive a autora do tweet.

O problema da audiência

A primeira parte do problema é que as pessoas não dão audiência para conteúdo que não seja engraçadão ou lacrador. O conteúdo existe, mas não cai na mãozinha do usuário preguiçoso porque não tem alcance. Depois desse tweet, a autora recebeu uma enxurrada de respostas de conteúdos e referências. Não é que não existe, é que não é famoso.

A imensa maioria dos conteúdos que as pessoas consomem hoje chegam até elas pelos seus contatos nas redes sociais. Vivemos uma época tão sobrecarregada de informações que as pessoas não sabem mais pesquisar. Querem saber, mas querem que algum ser supremo lhes entregue a melhor informação pronta, sobre a qual sequer aplicam senso crítico. Um pouco de pesquisa e esforço de aprendizado é saudável, viu, galera?

Relevância e qualidade

Por algumas semanas, o desaste de Brumadinho ainda vai trazer uma tremenda atenção sobre impacto e responsabilidade ambiental, mas isso passa. E o conteúdo precisa ser produzido constantemente, com qualidade. Isso toma tempo e conhecimento específico.

Por melhor que seja sua prática em se maquiar, se você abrir um canal no Youtube agora, provavelmente seu conteúdo não será de qualidade técnica maravilhosa. Saber fazer uma coisa é muito diferente de saber transmitir seu conhecimento pela internet. Conteúdo de qualidade leva tempo. Um vídeo de 15 minutos, bem maravilhoso nível Nerdologia demora: 6 meses foi o tempo que ele disse que levou pra produzir um vídeo sobre o Antigo Egito.

O tempo para a qualidade e o tempo para construir o alcance que as pessoas querem caindo na sua mão sem esforço é um tempo que ninguém pensa. Todo mundo acha que é mágico. O único truque mágico pra alcance rápido e sem esforço é entrar para o BBB. Não recomendo.

E esse tempo para desenvolver esse conteúdo é adicional ao tempo para desenvolver o conhecimento acadêmico e prático. O empenho minimamente razoável pra investir nisso é de umas 20 horas por semana. Para quem trabalha, isso é abrir mão de suas noites ou de seus finais de semana. Por zero dinheiros. Por anos. Por algo que talvez dê dinheiro. Estamos falando de querer que alguém ensine uma faculdade inteira de tempo de graça. Ninguém pensa no absurdo que isso é?

Faça alguma coisa sobre isso

Se até aqui ficou claro, explico: a conta não se paga. Tornar-se um influenciador digital já não é tão simples, os grandes de hoje se fizeram em um cenário diferente que não é facilmente replicável. São necessários centenas de milhares de seguidores para ser possível viver de cliques em anúncios. Conquistar centenas de milhares de seguidores leva anos. Quem paga a conta ao longo desses anos? A conta do tempo investido é muito cara. Se o assunto não tem uma demanda imensa pra sempre, não vale a pena. As pessoas não estão dispostas a pagar R$ 1,99 pela assinatura de um bom jornal!

Por isso hoje o conteúdo de qualidade acaba sendo produzido por empresas, porque elas estão usando informação para vender seus produtos e serviços. As pessoas que não estão no campo do entretenimento só conseguem investir tempo de verdade nisso se forem se vender como palestrantes e isso depende de fazer muito dinheiro no segmento, o que funciona para pouquíssimas áreas de atuação. Pra marketing ok, super rola, mas pra responsabilidade ambiental? Dificilmente.

Quer incentivar? Pesquise sobre coisas profundas e relevantes, compartilhe sempre, mas não compartilhe coisas rasas. E quando vir algo de qualidade, ajude a pagar a conta. Veja o vídeo de anúncio inteiro, não pule depois de 5 segundos. Leu um bom conteúdo? Clique nos banners que tem no blog. Ajude a pagar a conta! Já que ninguém quer pagar por um curso, pelo menos subsidiem com o dinheiro dos anunciantes.

Alguém tem que pagar a conta, conteúdo digital de qualidade não é filantropia. Valorize.

obs.: ain, mas a pessoa pode receber dinheiro direto de empresas pra falar de seus produtos e seus serviços. Sim. Mesmo para isso, a pessoa precisa do conhecimento técnico, do conteúdo de qualidade, do tempo e da audiência. Valorize.


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